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Autismo... é preciso compreender para entender

O transtorno no desenvolvimento que afeta cerca de 70 milhões de pessoas em todo o mundo
Para ajudar a conscientizar a população mundial sobre o autismo, um transtorno no desenvolvimento que afeta cerca de 70 milhões de pessoas em todo o mundo, no dia 2 de abril foi comemorado o Dia Mundial da Conscientização do Autismo, ou simplesmente o Dia Mundial do Autismo. Essa data foi criada pela Organização das Nações Unidas em 2007, com o objetivo de alertar as sociedades e governantes sobre este transtorno, ajudando a derrubar preconceitos e trazer esclarecimento a todos.
Em São Miguel do Oeste, a Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) atende crianças com diagnóstico de autismo desde a primeira infância, onde o mesmo pode vir a ser confirmado por avaliação clínica e equipe multidisciplinar. A informação é da coordenadora do Serviço de Saúde da Associação, psicóloga e especialista em Neuropsicologia, Juliana Camini Oliveira (CRP-SC Nº 12/07542). De acordo com ela, inicialmente, as crianças passam por protocolo de triagem com a assistente social e após são agendadas as avaliação que confirmam o laudo e grau de autismo.
Até os seis anos, a Apae pode atender crianças com autismo de grau leve à severo. Após esta idade, com sete anos, o atendimento é voltado para os autistas de baixo funcionamento, ou seja, aqueles considerados severos, que apresentam mais sintomas de autismo e possibilidade de prejuízo intelectual acentuado. Atualmente, a Apae de SMOeste possui seis autistas adultos (idades de 28 à 47 anos), um autista adolescente (16 anos) e 10 autistas crianças (de dois a oito anos).
Como já destacado, a avaliação de uma criança com suspeita de autismo é clínica. Ao psicológico cabe a entrevista minuciosa com os pais, a observação e intervenção com a criança e o inquérito com o uso de questionários específicos (escalas). Há indicativos de autismo em bebês com seis meses, que podem ser vistos pela pouca procura da mãe e a falta de contato visual que muitas vezes é sutil. No entanto, quanto mais cedo for feito o diagnóstico, melhor será o prognóstico em virtude da intervenção precoce. Na Apae, a criança passa por avaliações em diversas áreas: Pedagogia, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Terapia Ocupacional, Exame Neurológico e Exame Físico. Constatado o diagnóstico, se estabelece um plano de tratamento multidisciplinar para a criança ou adulto, com atendimentos especializados, bem como terapias de Equoterapia e Hidroterapia.
Para melhor compreender o quadro que envolve o autismo, Juliana explica que se trata de um transtorno global de desenvolvimento infantil que se manifesta antes dos três anos de idade e se prolonga por toda a vida. A profissional esclarece que os níveis de gravidade se baseiam na quantidade de apoio necessário, ou seja, quanto maior a dificuldade de interação social, comunicação e estereotipias e comportamentos inadequados, maior a gravidade e necessidade de intervenção. Hoje, conforme a psicóloga, se utiliza o termo TEA (Transtorno do Espectro Autista) para todos os casos diagnosticados e apenas se diferenciam os graus. O antigo autismo clássico envolvia pessoas voltadas para si mesmos, sem necessidade de busca do outro, com pouco ou nenhum contato visual, com dificuldade em interagir e buscar as pessoas, que podiam falar, mas que usavam pouco a comunicação verbal e não-verbal. Essas características permanecem, mas ainda se visualiza os autistas de alto desempenho (os chamados Asperger), que possuem estas mesmas limitações, com menor intensidade, sendo mais verbais e inteligentes, podendo se destacar acima da média em áreas específicas de seus interesses.
Identifique, ajude e compreenda um autista
Juliana ressalta que é importante que as pessoas entendam que nos autistas a interação social se mostra deficitária através de inadequadas respostas emocionais. "Eles geralmente não conseguem manter e gerar relações alicerçadas pela trocas de afeto. Suas expressões sociais são rígidas, limitadas e causam estranhamento. A percepção social é prejudicada, há pouca habilidade em identificar expressões faciais e, sendo assim, de perceber o desejo ou intenção do outro. Possuem dificuldade em imitar gestos e ações e por consequência disso ocorre o déficit no estabelecimento das relações, já que a imitação possibilita que a criança compreenda seu mundo, prestando a atenção no mesmo e aprendendo a lidar com as suas emoções e com a dos outros", comenta. Segundo a profissional da Apae, as crianças autistas não optam por se isolar. Não é uma escolha, mas sim uma falta de habilidade de interação que acaba criando uma visão ameaçadora do contato social. A comunicação evidencia alterações importantes, têm dificuldade de expressão e compreensão e, muitos, não aprendem a falar. Para aqueles que desenvolvem a linguagem, muitas apresentam dificuldades. "A fala se mostra pouco espontânea, com ritmos e entonação que causam estranheza. Falam repetidamente sobre o mesmo tema, ou alteram o assunto da conversa sem transição lógica. Há a evidente dificuldade em compreender temas abordados, regras ou instruções. Sendo assim, a resposta negativa a orientações não se dá por oposicionismo, mas por falta de compreensão do que foi solicitado. A forma concreta com que o autista percebe o mundo, não permite com que ele perceba as sutilezas de uma conversa, o que acaba causando confusão em relação ao que está sendo tratado, já que fazem uma avaliação sempre literal dos termos utilizados em um discurso", explica.
Aprenda a lidar com a dificuldade na interação social
A especialista em Educação Especial, Cristiane Magrini Dutra, salienta que o que deve ser claro é que o autista tem muita dificuldade na interação social e é este o fator principal que vem a afetar o desenvolvimento das demais habilidades. Há uma falta de interesse e necessidade do outro, dificuldade em manter um relacionamento social com seus pais e pessoas próximas, sendo que com desconhecidos o estabelecimento de vínculo demora mais. "Eles possuem padrões restritos de comportamento, interesses peculiares e específicos, fixação por determinados objetos, necessidade de uma rotina rígida para se organizar, pois o pensamento é rígido, com pouca ludicidade, com dificuldade de entender ao pé da letra o que se diz, podem ser resistentes as regras e comportamentos impostos. Algumas crianças são bastante chorosas nos primeiros anos de vida pela dificuldade de serem compreendidos por seus pais e por que muitas situações causam desconforto", aponta.
Cristiane também ressalta que os comportamentos motores estereotipados e repetitivos são caracterizados por movimentos de balançar, pular, mexer com dedos e mãos, fazer caretas, andar de modo diferente, rodopiar, entre outros. "Estas manifestações sempre ocorrem da mesma forma e de maneira repetitiva. Já os comportamentos são caracterizados por rituais, compulsões, insistências, interesses baseados em regras específicas e necessidade em acumular objetos sem objetivo aparente, apenas para tê-los. Há um padrão anormal e restrito nos interesses. Autistas podem saber tudo sobre um tema específico a ponto de não conseguirem direcionar sua atenção a outros aprendizados, principalmente aos relacionados com a vida afetiva e cotidiana. Isso acaba por causar importantes prejuízos no que diz respeito a socialização", cita. Juliana alerta, é preciso ter clareza no olhar que se tem sobre os comportamentos, pois estes não são esporádicos, são presentes e repetitivos. Podem haver atrasos na motricidade ampla ou fina, muitas vezes devido sua hipersensibilidade tátil, mas o maior prejuízo em questão de atraso está na interação social e no desenvolver da linguagem. Mais tarde, senão trabalhados devidamente, estes atrasos afetarão o desenvolver da autonomia e da aprendizagem.
Na parte da cognição, Juliana destaca que as maiores limitações nos autistas envolvem a atenção, a memória e as funções executivas e devem ser trabalhadas e aprimoradas pelos profissionais que acompanham estas pessoas.
Juliana e Cristiane orientam que todo tratamento de pessoas com autismo envolve orientação familiar, desenvolvimento da linguagem, facilitação da interação social e manejo dos comportamentos inadequados. As profissionais esclarecem que atualmente há alguns tratamentos reconhecidos internacionalmente como o Método Teacch, o Método PECS e o ABA. O Teacch é inclusive aplicado na Apae.
Fatores de risco
Sobre fatores de risco para o autismo, a psicóloga revela que estudos estão sendo feitos, e o que se tem comprovação é que os fatores genéticos ainda são os mais evidentes, ou seja, pais que tem um filho com autismo as chances do segundo nascer com o mesmo quadro é de 11% para menina e 25% no caso do bebê ser menino. Caso um dos irmãos tenha sido diagnosticado com autismo a probabilidade do outro vir a ter é de 36% a 95%. Quando são gêmeos não idênticos a chance diminui para 30%. Consideram-se ainda os fatores ambientais, ou seja, aqueles que estão relacionados a danos sofridos no cérebro (em desenvolvimento) no período da gestação. Algumas doenças como rubéola, meningites, consumo de drogas e álcool, desnutrição da mãe entre outras podem desencadear alterações de estruturas no cérebro em formação, como também modificar fatores imunológicos e bioquímicos do organismo. A prematuridade, diabetes, pressão alta, uso de antidepressivos, adoecimento na gestação, falta de vitamina D, excesso de contato com poluentes da mãe também são considerados fatores ambientais de risco.
Lembrando que o autismo não é uma doença, é um transtorno, e até pode ser chamado de síndrome por envolver comportamentos específicos. Por não ser doença não há uma cura e a criança já nasce com esta condição. Atualmente se tem uma estimativa de uma a cada 68 crianças com autismo, sendo os mais acometidos os meninos, um a cada quatro.
A importância do envolvimento
Juliana ainda considera importante destacar que muitas vezes os pais se mostram resistentes as mudanças indicadas pelos profissionais, sejam estas no trato comportamental ou o uso de medicamentos para auxílio do tratamento. "A não aceitação das indicações não só prejudica o trabalho a ser desenvolvido como impede a criança de adquirir as habilidades necessárias para o aprimoramento da linguagem e da interação social. Mesmo sendo crianças, todo tratamento indicado deve ser seguido, pois só assim será possível adequar os comportamentos e facilitar o desenvolvimento. E lembrando novamente, todo autismo precisa de um plano de tratamento terapêutico, rotinas estabelecidas, aprimoramento das funções cognitivas, estimulação da linguagem, estimulação pedagógica, acompanhamento psicológico e tratamento médico", orienta.
A psicóloga ainda alerta que se deve tomar cuidado na busca por tratamentos milagrosos e que prometem a cura, a família precisa permanecer com olhar voltado ao que realmente se esta comprovado cientificamente. "O tratamento tardio ou a não aceitação das propostas indicadas não irão contribuir para o desenvolvimento deste indivíduo. Portanto, não haja sozinho, busque e aceite as intervenções", reforça.




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